STF retoma julgamento sobre restrições para vasectomia e laqueadura

Caso está na pauta do plenário desta quarta (12)

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Marcello Casal Jr/Agência Brasil/Arquivo

O STF (Supremo Tribunal Federal) tem na pauta do plenário desta quarta-feira (12) a retomada do julgamento sobre esterilização voluntária. O caso discute as condições para que homens e mulheres possam fazer cirurgias de vasectomias e laqueaduras no país.Hoje, qualquer pessoa com 21 anos de idade (independentemente do número de filhos) ou que tenha pelo menos dois filhos pode fazer o procedimento. Para isso, precisará, no entanto, aguardar ao menos 60 dias entre o pedido e a cirurgia.Até o momento, dois votos foram dados, o do relator, Kassio Nunes Marques, e o de Flávio Dino. O primeiro voto da sessão de retomada será de Cristiano Zanin.Caso a posição deles prevaleça, o STF deve manter o texto atualmente em vigor, definindo que pessoas com menos de 21 anos, mas sem ter mais de dois filhos, não podem fazer o procedimento. A corte retiraria, no entanto, o trecho que determina um aconselhamento antes da esterilização.Hoje, o trecho que fala da necessidade de ter dois filhos vivos é um ponto alternativo ao da idade mínima. Ou seja, se uma pessoa tiver dois filhos vivos aos 19 anos, está apta à esterilização.Embora também dirigida aos homens, a regra anterior, de 1996, era especialmente criticada no que diz respeito aos direitos reprodutivos das mulheres. A norma ditava que, em relações conjugais, cirurgias de esterilização só poderiam ser feitas com o consentimento do cônjuge.O tema chegou ao Supremo em 2018 por meio de uma ação do PSB contra trechos da Lei do Planejamento Familiar sobre condições como idade superior a 25 anos ou dois filhos vivos e autorização expressa de ambos os cônjuges para a realização de esterilização voluntária.A legenda defende que não cabe ao Estado interferir no planejamento familiar. O PSB pede a retirada da obrigatoriedade de descendentes e a redução da idade mínima para 18 anos.Para o partido, a lei afronta direitos fundamentais e tratados internacionais firmados pelo Brasil e diverge dos principais ordenamentos jurídicos estrangeiros.A matéria começou a ser apreciada pelos ministros em abril do ano passado, mas foi suspensa duas vezes. No primeiro momento, o plenário ouviu as sustentações orais e, em setembro, Zanin pediu vista —mais tempo para análise— depois de dois votos dados.No entendimento do relator, para os casos de pessoas abaixo de 21 anos e com dois filhos, também não deveria ser possível a esterilização.”A lei não surgiu com o propósito de restringir liberdade de homens e mulheres sobre os seus próprios corpos, mas como resposta ao quadro de clandestinidade e excesso de cirurgias esterilizadoras”, afirmou Kassio.De acordo com ele, não há excessos no texto em vigor. Para o ministro, o Estado tem o dever de instruir a população sobre controle de natalidade e apresentar métodos de contracepção menos invasivos e reversíveis. A seu ver, também cabe ao Estado orientar para o uso dos métodos e fornecê-los gratuitamente a quem precisar.Nunes Marques lembrou que o SUS (Sistema Único de Saúde) oferece nove métodos: anticoncepcional injetável mensal e trimestral, minipílula, pílula combinada, diafragma, pílula de emergência (conhecida como pílula do dia seguinte), DIU (dispositivo intrauterino), preservativo feminino e preservativo masculino.”É perverso apresentar a uma jovem que sequer atingiu a maioridade civil e, possivelmente, em situação de vulnerabilidade, a opção de tornar-se definitivamente estéril, como resposta para um problema social grave, que é a gravidez na adolescência”, disse.A nova lei em vigor desde março de 2023 e alterou a regra para fixar os 21 anos ou dois filhos vivos para a autorização para pedir o procedimento —antes eram 25 anos.Além do período de dois meses, o interessado deve passar por aconselhamento de equipe multidisciplinar da saúde, “com vistas a desencorajar a esterilização precoce” mas, se mantida a vontade, não há nada na legislação que impeça a realização do procedimento, diz a lei.Ao acompanhar o relator, Dino sugeriu a exclusão do trecho sobre o “aconselhamento por equipe multidisciplinar, com vistas a desencorajar a esterilização precoce”. Isso porque, no entendimento dele, não deve haver nenhum encorajamento ou desencorajamento, mas apenas a informação sobre o procedimento por profissionais nos casos de esterilização precoce.Dino afirmou que o Estado não tem o papel de interferir na vontade de quem busca o serviço. O ministro avaliou que essa previsão viola a autonomia das pessoas e que o objetivo da norma é o planejamento familiar, que não compete à equipe multidisciplinar. O relator acolheu a sugestão.Outra alteração da lei que passou a vigorar em 2023 é sobre a realização da cirurgia em casos de parto. No texto original, a esterilização não poderia ser feita durante o parto ou aborto. Agora, a nova lei abre a possibilidade de o procedimento ocorrer no decorrer do nascimento de um bebê.Na ocasião, a lei foi considerada um avanço aos direitos das mulheres. A mudança foi votada de forma simbólica em agosto de 2022 pelo Senado em uma sessão dedicada a pautas relacionadas a mulheres em ocasião do aniversário da Lei Maria da Penha.A mudança na legislação levou o Supremo a avaliar se a ação do PSB deveria ser arquivada por perda de objeto. O partido pediu que o caso não fosse extinto, já que permanecia contra a idade mínima de 21 anos para o procedimento.Para a advogada Vitória Buzzi, a redação atual da lei não respeita a dignidade e autonomia de mulheres. “O voto do Ministro Flavio Dino acerta quando afasta o trecho da lei que prevê o desencorajamento da esterilização dita ‘precoce'”, diz ela, que atua no Projeto Cravinas (Clínica de Direitos Sexuais e Reprodutivos da UnB) e participa como amicus curiae na ação. “Mas os votos já proferidos ainda não trazem o avanço esperado e necessário à discussão de justiça reprodutiva no Brasil.”No início do julgamento, André Mendonça era o chefe da AGU (Advocacia-Geral da União) do governo Jair Bolsonaro (PL) e foi contra os pedidos do PSB. “Se revela adequado exigir certo grau de maturidade para seu exercício válido”, afirmou.Uma pesquisa feita em seis capitais brasileiras verificou que após um período de cerca de 6 meses, apenas 25,8% das mulheres e 31% dos homens que demandaram a cirurgia haviam obtido sucesso.

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