Ler é mesmo o melhor remédio

Se você está lendo este texto, certamente é porque a forma “texto” ainda é um excelente meio para o aprendizado, seja em papel ou digital. Outro dia, fiz contato com um cidadão, um CXX de uma grande multinacional que exibe como verdade inconteste a famosa Pirâmide de Glasser, no LinkedIn. Mandei-lhe uma mensagem explicando que essa pirâmide é falsa e indicando um artigo que refuta essa ideia. Ele nem se deu ao trabalho de ler! Imagina, ler é uma besteira! William Glasser, acredito, deve se revirar no túmulo quando lhe atribuem essa pirâmide, com as porcentagens que indicam o quanto aprendemos ao utilizar diferentes métodos de aprendizagem. Glasser foi um cientista importante que também estudou o processo de aprendizagem. Mas, daí a atribuir a ele essa “famosa pirâmide” são passos muito largos e tortuosos. Ou a estultice está tomando conta da minha “cachola” ou há algo muito errado no senso crítico das pessoas que insistem em divulgar essa “besteira”. A tal pirâmide informa qual a porcentagem de aprendizado que as pessoas conseguem ao ler algo, bem como a porcentagem para outros métodos de aprendizagem. Sabe quanto a pirâmide atribui à leitura? Apenas 10%. Ou seja, ler, segundo essa vertente ilógica e irracional, é um dos métodos mais ineficazes do processo de aprendizagem. Não há dúvidas de que podem existir métodos mais eficazes — por exemplo, aprender fazendo. Ou, quando ensinamos, a aprendizagem tem um nível de retenção maior do que quando apenas lemos. Isso é incontestável. Mas, para ensinar, por exemplo, no meu caso que sou professor, mesmo quando domino o assunto, leio novamente, leio sobre novos conhecimentos, me instruo para repassar aos alunos. Sabe a grande ironia? É que, lendo, aprende-se muito. Todo o conhecimento da aldeia global foi obtido pela leitura. Eu, particularmente, leio, tomo de uma caneta e escrevo. No papel mesmo! E descobri que muita gente faz assim. Mesmo sendo eu um ser altamente tecnológico, prefiro uma boa caneta e um bom papel para traçar minhas linhas e gravar na memória aquilo que acabei de ler e me interessei em fixar o conhecimento. Aliás, não sei se você já reparou, a maioria do aprendizado que adquirimos vem da leitura. É esse aprendizado que fixamos e o tornamos mais profundo quando discutimos com outras pessoas ou quando ensinamos. Libânio (você pode até discordar de sua linha ideológica, mas não dá para discordar dessas verdades) afirma que “aprender é formar o pensamento teórico-científico, isto é, formar conceitos teóricos apropriados de um objeto de estudo”. O livro, para esse autor, cria o elo fatal entre o conhecimento e a vida prática do aluno. Percebe? O livro, digo, a leitura, é a ladeira que nos leva ao monte chamado conhecimento, em cujo ápice se encontra o gozo que extasia a alma. Uma das maiores revoluções humanas foi proporcionada por Gutenberg, um monge do Sacro Império Romano-Germânico. Que revolução foi essa, mais importante que a indústria 5.0, que a internet, que o celular? Você bem sabe que esse monge teve a fantástica ideia de criar tipos móveis, que permitiram escrever frases, parágrafos, textos, e reproduzi-los em grande quantidade de papel, democratizando a leitura, criando livros, panfletos, propagandas, etc. A velha e boa leitura que ilumina a alma e enriquece o âmago do conhecimento. Então, amigos, vamos deixar Glasser sossegado e parar de cair nas esparrelas de fake news. Ler não nos confere apenas 10% do aprendizado. Ler é a base do aprendizado. E que Deus perdoe os iletrados que disseminam idiotices. Ah, se você acredita nessas besteiras, perdeu tempo e esforço lendo este texto. Que desperdício! (*) Humberto Felipe da Silva é professor da Escola de Engenharia de Lorena da USP (Universidade de São Paulo).
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