Voçorocas voltam a engolir casas em Buriticupu, no MA; cidade decreta calamidade pública


Problema já existe há mais de 30 anos, mas nunca foi contido pelo poder público. Veja vídeos. Casa é ‘engolida’ por voçoroca e assusta moradores em Buriticupu
O retorno do período chuvoso trouxe de volta o pesadelo de conviver com o aumento das crateras que ameaçam a vida de milhares de moradores em Buriticupu, no Maranhão. Nos últimos dias, mais casas foram engolidas pelas voçorocas e a prefeitura decretou estado de calamidade pública.
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Provocado pela erosão do solo, o problema existe há mais de 30 anos na cidade e já causou destruição de casas e até mortes. Até hoje nunca houve solução ou contenção que evite de forma eficaz o avanço das crateras.
Até 2024, 180 famílias estavam em situação de risco e, em 2025, mais famílias tiveram que deixar as residências próximas de onde as voçorocas já alcançaram.
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O decreto municipal de calamidade pública afirma que, este ano, há 1.200 pessoas em 250 moradias situadas em áreas de risco, nos bairros: Caeminha, Centro, Vila Isaias, Santos Dumont, Eco Buriti, Terra Bela, Sagrima e Terceira Vicinal.
No final de janeiro, uma das residências foi engolida na Rua Vitória e provocou desespero nos vizinhos (veja no vídeo acima). A casa, que já tinha sido abandonada, foi levada para o abismo e as demais residências ao redor precisaram ser evacuadas.
Moradores se assustam após queda de casa em voçoroca, em Buriticupu
Reprodução/redes sociais
Por conta do novo avanço das voçorocas, a Justiça do Maranhão determinou, no início de fevereiro, que o município de Buriticupu adote providências para a contenção das voçorocas, em diversos pontos da cidade. A sentença atendeu a um pedido do Ministério Público.
“O município de Buriticupu ainda não solucionou o problema de forma plenamente eficaz mesmo diante de reiteradas notificações do Ministério Público e dos compromissos assumidos em sede de conciliação, o que justifica a necessidade de uma decisão judicial impositiva”, justificou, na sentença, o juiz.
Crateras ameaçam centenas de moradores em Buriticupu, no Maranhão
Reprodução/Marinho Drones
Consta na decisão judicial que o município deve:
delimitar e isolar, no prazo de 30 dias, com sinalização adequada, todas as áreas com risco de desabamento e movimentos de massa decorrentes das voçorocas;
atualizar, no prazo de 30 dias, o cadastro de todas as famílias residentes nas proximidades das áreas afetadas, providenciando aluguel social para aquelas expostas a risco iminente.
apresentar, no prazo de 120 dias, um plano detalhado para execução de obras de contenção das voçorocas, com cronograma físico-financeiro;
implementar, em 180 dias, as medidas para mitigação dos impactos ambientais;
recuperar, ambientalmente, as áreas degradadas no prazo máximo de quatro anos
Poucas obras de contenção
Desmatamento causou crateras que ameaçam ‘engolir’ casas no MA
Kayan Albertin/g1
Segundo os moradores, nos últimos 30 anos, houve apenas algumas ações paliativas em áreas críticas, como próximo de rodovias. Em outras regiões, as voçorocas seguem avançando e engolindo casas.
Em março de 2023, a Defesa Civil Nacional esteve em Buriticupu avaliando a situação. Na época, foi decretado estado de calamidade pública. O Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional se comprometeu em ajudar a resolver o problema.
Porém, desde então, a prefeitura diz que houve o repasse de apenas R$ 687 mil para aquisição de materiais de assistência humanitária para as famílias desabrigadas, desalojadas e afetadas pelo avanço erosivo das voçorocas.
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O prefeito de Buriticupu, João Carlos (PP), reeleito em 2024, afirmou que foram realizadas algumas obras de contenção no ano passado, que estariam ajudando a diminuir os transtornos das chuvas este ano, apesar das reclamações dos moradores de que o serviço ‘não teve resultado’ (veja a nota na íntegra no final da reportagem).
João Carlos diz ainda que aguarda o envio de recursos e serviços prometidos pelo governo federal, pois estaria trabalhando sem apoios diante de uma realidade que a prefeitura não conseguiria resolver com os próprios esforços.
O g1 entrou em contato, mas o governo federal ainda não se pronunciou sobre as alegações de falta de envio de recursos para os serviços em Buriticupu.
Entenda o caso
30 anos das voçorocas que engolem casas em Buriticupu
Em Buriticupu, enormes abismos se formam onde há pouca vegetação e o solo fica desprotegido. Conhecido como voçorocas – que significa terra rasgada em tupi-guarani – as crateras gigantes começaram a surgir na cidade há mais de 30 anos, a partir da rápida expansão urbana, como consequência do desmatamento da vegetação nativa. Alguns desses abismos têm até 70 metros de profundidade e 500 metros de comprimento.
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Devido à incidência do processo de erosão e dos riscos à segurança dos moradores, bem como ao meio ambiente, o Ministério Público instaurou Inquérito Civil e ficou acordado que o município iria delimitar e isolar áreas, interditar imóveis, remover as pessoas expostas aos riscos e realizar ações de contenções das voçorocas.
Situação preocupa quem vive próxima as crateras em Buriticupu
Reprodução/TV Mirante
Porém, segundo o promotor de justiça José Frazão Menezes, ao longo do processo houve dificuldade de comprovação das ações adotadas pelo município.
“Nossa expectativa agora é que não sejam apenas adotadas, mas devidamente comprovadas todas as providências determinadas pela justiça, vez que os prazos são perfeitamente exequíveis, não devendo mais se despender tempo discutindo-se judicialmente direitos tão evidentes, pois se referem à situação de risco envolvendo pessoas e o meio ambiente”, observou o membro do Ministério Público.
O que são as voçorocas
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As crateras são pequenos fenômenos geológicos que surgem como fendas no solo, geralmente provocadas pela água da chuva. Se nada é feito para conter, uma cratera pode chegar ao grau de voçoroca, quando atinge um lençol freático.
Em Buriticupu, as crateras se formaram a partir da rápida expansão urbana e como consequência do desmatamento da vegetação nativa em áreas de alta declividade. Na cidade, os abismos chegam até 70 metros de altura e 500 metros de comprimento e ameaçam ‘engolir’ casas.
Vista aérea mostra cratera em Buriticupu, no Maranhão, em 28 de março de 2023.
REUTERS/Mauricio Marinho
Nota da Prefeitura de Buriticupu
“O Município de Buriticupu/MA, por meio do Gabinete do Prefeito esclarece que a declaração de calamidade pública, por meio do Decreto Municipal nº 002/2025, de 11 de fevereiro de 2025, foi adotada como medida necessária diante do grave cenário de crise, especialmente no que se refere à intensificação das voçorocas e aos danos estruturais causados pelas chuvas. O decreto em referência permite ao Poder Executivo a implementação de ações emergenciais com maior celeridade, e ainda, a requisição de auxílio ao Governo Federal, uma vez que o Município, sozinho, não possui a capacidade financeira necessária para enfrentar a magnitude dos danos e as ações requeridas. Além disso, desde o reconhecimento da situação de calamidade pública, com a edição dos Decretos Municipais nº 009/2023 e nº 014/2023, o município recebeu recursos apenas para ações humanitárias, conforme as Portarias-MDR nº 1238 e nº 1426, de 2023. O valor total efetivamente recebido até o momento foi de R$ 793.010,40, destinados a ações de resposta e restabelecimento dos danos causados pelas chuvas. Contudo, é importante destacar que os projetos para conter o avanço das voçorocas estão devidamente cadastrados no sistema do S2iD, com o empenho liberado na ordem de aproximadamente 32 (trinta e dois) milhões de reais, faltando apenas a expedição da ordem de serviço por parte do Governo Federal para a contratação das empresas responsáveis pela execução das obras de contenção. A respeito da obra de contenção realizada na Estrada do povoado Acampamento, custeada com recursos próprios, diversamente do que sustentam os moradores, não se encontra arruinada, mas resistindo às consequências do atual inverno. E, embora tenha sido uma tentativa do município de mitigar os efeitos do processo erosivo, não pôde ser concluída devido à intensificação das chuvas, que impossibilitaram a continuidade dos trabalhos. Essa intervenção foi uma ação emergencial, dada a ausência de apoio efetivo do Governo do Estado do Maranhão e do Governo Federal. As condições climáticas adversas e a magnitude das obras necessárias tornam claro que o município não tem capacidade financeira para resolver sozinho um problema dessa envergadura. As voçorocas exigem intervenções estruturais de grande porte, que só podem ser executadas com a parceria de instâncias superiores. Diante do grave cenário instalado, Buriticupu clama por apoio imediato das instâncias estaduais e federais para a realização das obras necessárias à contenção das voçorocas e ao restabelecimento das condições mínimas de infraestrutura e segurança para a população. O município enfrenta uma crise de proporções elevadas, e as ações emergenciais até o momento, embora essenciais, são insuficientes para resolver de forma definitiva o problema. A cidade precisa urgentemente de um planejamento conjunto, com recursos e ações coordenadas, para que a população tenha as condições necessárias para superar essa grave situação. O Município de Buriticupu reafirma seu compromisso com a busca de soluções para a crise, e permanece à disposição para prestar os esclarecimentos necessários”, diz a nota.
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