Casal de mulheres que fez inseminação caseira garante direito à maternidade na Justiça em MT

Uma família de Campo Novo dos Parecis, formada por um casal homoafetivo, recorreu à Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT) para o reconhecimento legal da dupla maternidade de seu filho, de um ano de idade, concebido por meio de inseminação caseira. O pedido foi aceito pela Justiça, o que, na avaliação da Defensoria, “marca um avanço significativo no reconhecimento de direitos para famílias LGBTQIA+ no Brasil”.

O casal, que está junto desde 2019, composto por duas mulheres, realizou a inseminação artificial de maneira caseira. Entretanto, o menor foi registrado somente em nome da mãe biológica, contrariando assim o desejo em comum das mulheres. “Assim que ele nasceu, a gente não registrou no hospital porque queríamos ir no cartório, porque a gente já sabia que ia ser um pouco mais difícil, o nosso caso era mais diferente. Aí, a gente foi lá no cartório registrar e o cartório falou que a gente não tinha como registrar no nome das duas mães, que teria que ser só no nome da mamãe que ficou grávida. Não tinha como colocar o nome dela e o meu nome na certidão dele”, contou uma delas.

Em busca de garantir os direitos de ambas sobre a criança, como guarda, educação e benefícios legais, a família acionou a DPEMT para assegurar que as duas fossem reconhecidas como mães e que a criança tivesse acesso a todos os direitos decorrentes dessa união. “Como a gente não tinha o dinheiro para pagar a advogada fomos na Defensoria Pública e abrimos o processo, essa ação, para incluir meu nome na certidão dele. Aí então a gente estava esperando”, disse.

Na ação, a Defensoria Pública argumentou que “após o nascimento do infante, ambas as autoras dispõem de criação e desenvolvimento dos laços afetivos, que juntas têm fornecido todo o cuidado e amparo necessário ao integral desenvolvimento da criança”.

Em sua manifestação, o Ministério Público Estadual ressaltou entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que já permitiu expressamente o reconhecimento da dupla maternidade em razão de técnicas de inseminação caseira. “A inseminação caseira é válida para o reconhecimento de dupla maternidade em uniões homoafetivas, respeitando o direito ao planejamento familiar e o melhor interesse da criança, e cumprindo os requisitos do Código Civil para presunção de maternidade. É possível presumir a maternidade de mãe não biológica de criança gerada por inseminação artificial ‘caseira’ no curso de união estável homoafetiva”.

A juíza Cláudia Anffe Nunes da Cunha, que julgou o pedido, observou que “ainda que a inseminação artificial tenha sido realizada de forma caseira, sem a intervenção de uma clínica especializada, tal fato não impede o reconhecimento da dupla maternidade, uma vez que restou demonstrado que a decisão de ter um filho foi tomada em conjunto pelas autoras, que ambas consentiram com a inseminação e que ambas exercem a maternidade de forma responsável e afetuosa”. Ainda na decisão, a magistrada disse que “o reconhecimento da dupla maternidade, no presente caso, atende ao melhor interesse da criança, que tem o direito de ter sua filiação reconhecida em relação a ambas as mães, garantindo-lhe segurança jurídica, proteção social e o pleno desenvolvimento de sua personalidade”.

O defensor público Daniel Rodrigo de Souza Pinto disse que a decisão favorece o desenvolvimento emocional e psicológico da criança. “Ao garantir os direitos da criança por meio do reconhecimento da dupla maternidade, a decisão favorece seu desenvolvimento emocional e psicológico, proporcionando um lar de afeto e condições adequadas para um crescimento saudável. Além disso, essa medida reconhece os direitos tanto da criança quanto das mães, podendo ter implicações em questões como herança, prestação de alimentos, guarda, entre outros. Trata-se de um importante precedente jurídico que promove a igualdade e a inclusão, refletindo a diversidade das configurações familiares na sociedade”.

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