‘Lei anti-Oruam’: projetos de lei querem proibir recursos públicos em shows com apologia ao crime na Paraíba


Projetos de lei estão tramitando na Assembleia Legislativa da Paraíba e na Câmara Municipal de João Pessoa. Oruam tem o nome associado a um projeto de lei
Reprodução / Instagram Oruam
A Assembleia Legislativa da Paraíba e a Câmara Municipal de João Pessoa têm projetos em tramitação que buscam proibir o uso de recursos públicos para shows e outros eventos artísticos que façam apologia ao crime.
As propostas são semelhantes à que ficou conhecida como “Lei Anti-Oruam”, em referência ao rapper carioca Oruam, inicialmente apresentada na Câmara Municipal de São Paulo. A iniciativa também se espalhou por outras capitais do país, como Rio de Janeiro, Florianópolis e Manaus.
A lei proposta em São Paulo busca impedir a contratação de shows, artistas e eventos voltados ao público infantojuvenil que façam apologia ao crime organizado ou ao uso de drogas. Já os projetos protocolados na Paraíba são mais abrangentes e preveem a proibição de eventos que promovam apologia ao crime para públicos de qualquer idade.
Na Câmara Municipal de João Pessoa
Câmara Municipal de João Pessoa
Francisco França/Jornal da Paraíba
Em João Pessoa, a iniciativa é do vereador Milanez Neto (MDB) e busca proibir qualquer tipo de incentivo financeiro da administração municipal a eventos que façam apologia ao crime, em especial ao crime organizado. A proposta foi protocolada no dia 6 de fevereiro.
O texto do projeto define como apologia ao crime ações como:
Exaltação de facções criminosas, grupos armados ilegais ou organizações ilícitas;
Incentivo à prática de crimes, incluindo tráfico de drogas, porte ilegal de armas e outros atos previstos na legislação penal;
Letras, mensagens ou representações visuais que estimulem a violência, o desrespeito às autoridades ou a corrupção.
Além disso, o projeto prevê penalidades para quem descumprir as regras, incluindo a anulação de apoios e patrocínios públicos, sanções administrativas para servidores envolvidos na concessão do benefício e a inclusão dos artistas em uma lista de impedidos de receber recursos municipais por até cinco anos.
Milanez Neto afirmou que a proposta surgiu após a última campanha eleitoral e a constatação do crescimento do tráfico de drogas na capital. Ele também mencionou a ocorrência de festas em comunidades da cidade que, segundo ele, seriam financiadas com dinheiro público e teriam ligação com o tráfico.
No entanto, ao ser questionado sobre exemplos concretos de artistas ou eventos que se enquadram na proibição, o vereador não soube citar nenhum caso específico.
Mesmo assim, ele defende que a medida visa “valorizar a cultura” e restringiria apenas apresentações que fazem referência explícita a drogas ou facções criminosas.
“A gente vive num estado pobre, onde precisamos fazer investimentos de forma verdadeira, real, na cultura da nossa cidade. Nós sabemos o sacrifício que é para promover cultura na cidade, em uma cidade como João Pessoa. Os verdadeiros homens e mulheres que promovem cultura sabem a dificuldade que é para acessar esses recursos e isso deveria ser algo que não precisaria nem ser lei, isso deveria ser da concepção, do entendimento dos gestores em sequer patrocinar esse tipo de evento (com apologia ao crime)”, afirmou Milanez Neto.
No texto do projeto, o vereador explica que a proposta tem base no artigo 37 da Constituição Federal, que estabelece a necessidade de a administração pública seguir determinados princípios, incluindo o da moralidade administrativa. Além disso, defende que é responsabilidade do poder público garantir a manutenção da ordem pública.
Na Assembleia Legislativa da Paraíba
No dia 14 de fevereiro, um projeto semelhante também foi protocolado na Assembleia Legislativa da Paraíba (ALPB). O deputado Sargento Neto (PL), autor do projeto, justificou que “eventos que exaltam comportamentos ilegais ou violentos podem contribuir para a normalização dessas práticas na sociedade, especialmente entre os jovens”.
Ele também afirma que shows que promovem facções criminosas podem “intensificar rivalidades e conflitos”, o que, segundo a proposta, poderia colocar em risco os participantes dos eventos, mas também a segurança de moradores e comunidades próximas.
O projeto é uma cópia de propostas apresentadas por outros deputados do Partido Liberal em Minas Gerais. Na justificativa do projeto de lei apresentado na Assembleia Legislativa da Paraíba, Sargento Neto esqueceu de remover a menção ao estado de Minas Gerais e ao povo mineiro.
Assembleia Legislativa da Paraíba
ALPB / Divulgação
De acordo com o texto do projeto de lei, a proposta quer proibir a utilização de recursos públicos estaduais, direta ou indiretamente, para eventos que promovam ou façam apologia ao crime. Também prevê a obrigação de devolução integral dos valores públicos utilizados, a aplicação de multa e a responsabilização dos gestores públicos e demais responsáveis pela contratação ou aprovação dos recursos.
O projeto define que é de competência do Governo da Paraíba fiscalizar a destinação dos recursos públicos utilizados na promoção de eventos artísticos e culturais, criar mecanismos de análise prévia de conteúdo dos projetos e eventos e suspender imediatamente a liberação de recursos ou contratos que descumpram a norma.
A proposta também quer que o Tribunal de Contas do Estado da Paraíba acompanhe e fiscalize a aplicação dos recursos públicos destinados a eventos culturais, para garantir a aplicação da lei.
Outras iniciativas semelhantes
Projeto de Lei ‘anti-Oruam’ está em debate em SP; Entenda
Iniciativas semelhantes já foram apresentadas em outras capitais, após a vereadora Amanda Vettorazzo (União Brasil), de São Paulo, ter sido a primeira parlamentar do país a protocolar um projeto de lei exatamente com o mesmo teor.
A proposta, apresentada pela vereadora Amanda Vettorazzo (União), busca proibir a contratação de shows, artistas e eventos voltados ao público infantojuvenil que promovam apologia ao crime organizado ou ao uso de drogas.
No texto, ela não cita o Oruam, no entanto, criou um site chamado leiantioruam e, em vídeos nas redes sociais, deixa claro que quer proibir o artista de se apresentar em São Paulo.
Print do site criado pela vereadora.
Reprodução
O projeto foi defendido pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), durante um evento para anunciar investimentos voltados para a Cultura na última segunda-feira (10). “Pra você ver que eu tenho um bom gosto pra música, nunca ouvi a música desse cara”, disse à jornalistas.
Os vereadores do Rio de Janeiro também vão começar a debater um projeto semelhante. Na última segunda-feira (17), os vereadores Talita Galhardo (PSDB) e Pedro Duarte (Novo) protocolaram o projeto que tenta proibir o município de contratar artistas que fazem apologia ao crime.
Em Brasília, o deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP), do MBL assim como Amanda, protocolou um projeto similar, só que com reflexos de âmbito nacional.
LEIA MAIS: Culpar e tentar tirar de cena artistas do funk e do rap, como Oruam, é ação tão condenável quanto a apologia ao crime
Quem é Oruam?
Show de Orochi, Chefin e Oruam no Palco Sunset Rock in Rio 2024
Miguel Folco/g1
Figura carimbada nos principais festivais do país, Mauro Davi dos Santos, de 25 anos, tem mais de 13 milhões de ouvintes só no Spotify. O cantor passeia pelo funk, R&B e rap. Suas músicas falam sobre ostentação, sexo e o fato de ele ser filho do traficante Marcinho VP.
Em 2024, se firmou de vez como um dos rappers mais promissores do trap. Mesmo ano em que subiu em um dos palcos do Lollapalooza e pediu liberdade pelo seu pai, preso por crimes como homicídio qualificado, formação de quadrilha e tráfico de drogas.
LEIA MAIS: Como Oruam chegou ao topo das paradas, por que ficou famoso e qual o perfil dos fãs?
Apontado como líder da facção criminosa Comando Vermelho, Marcinho VP é também acusado pelo Ministério Público pelos crimes de associação criminosa e lavagem de dinheiro.
Oruam tem uma tatuagem em homenagem ao pai e também ao traficante Elias Maluco, condenado pelo assassinato do jornalista Tim Lopes.
Oruam comentou no X a proposta que ficou conhecida como “Lei Anti-Oruam”.
“Eles sempre tentaram criminalizar o funk, o rap e o trap. Coincidentemente, o universo fez um filho de traficante fazer sucesso, eles encontraram a oportunidade perfeita pra isso. Virei pauta política. Mas o que vocês não entendem é que a lei anti-Oruam não ataca só o Oruam, mas todos os artistas da cena”, publicou o rapper.
Oruam faz show no Lolla e usa camisa pedindo liberdade ao pai, o traficante Marcinho VP
Vídeos mais assistidos do g1 Paraíba
Adicionar aos favoritos o Link permanente.