Justiça da Capital bloqueia R$ 797 mil para cirurgia na coluna

  Em meio ao debate sobre valores elevados para a realização de cirurgias pagos pelo Estado e prefeituras e da apresentação de ações para fazer andar fila de procedimentos na rede pública, uma decisão proferida na 4ª Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos de Campo Grande sequestrou R$ 797,2 mil do Município de Campo Grande para assegurar a realização de uma cirurgia na coluna. O MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) instaurou recentemente um inquérito civil para investigar se o poder público atuou devidamente para demonstrar excessos nos valores cobrados pelos procedimentos médicos. O caso em que houve o bloqueio do valor chegou à Justiça no ano passado e corre sob segredo de justiça. Somente foi possível verificar o sequestro do valor porque trecho da decisão foi publicado no Diário da Justiça. Pelo menos desde 2023 é possível ver com alguma frequência bloqueios elevados para cirurgias ortopédicas e neurológicas, especialidades que o SUS (Sistema Único de Saúde) tem contratualizado em Campo Grande. Ambas são prestadas na Santa Casa. Uma queixa recorrente é que a tabela de remuneração está defasada. Esta semana mesmo, outro inquérito do MPMS investiga a suspensão de serviços pelo hospital, que aponta crise financeira e demora na finalização do contrato com o Município. A nova cirurgia que será realizada na rede privada com recursos públicos é para a correção da cifoescoliose neuromuscular pela técnica bipolar, um desvio na coluna, com procedimento menos invasivo. Antes de definir o bloqueio dos valores, a Justiça determinou que a Prefeitura da Capital ofertasse o serviço, apresentando uma data. Isso foi publicado no Diário da Justiça em 28 de novembro, com a definição de prazo de 30 dias. Houve até tentativa de prorrogação, o que foi indeferido, segundo publicação de andamento do processo feita em dezembro. Em nova movimentação, no final de janeiro, a Justiça dá outro prazo para a prefeitura comprovar que adotou providências, de 5 dias. Ao mesmo tempo, já determina ao paciente que apresente mais dois orçamentos para a busca do menor valor. “Por conseguinte, não é demais destacar a crescente judicialização da saúde, a qual tem por causa a ineficiência administrativa na área e, embora caiba ao Poder Judiciário garantir o cumprimento das leis nas demandas de saúde não cumpridas voluntariamente pela Fazenda Pública, deve-se perseguir procedimentos que viabilizem o direito privado à saúde da parte autora, evitando-se ao máximo eventual prejuízo nas demais ações executivas da Administração, na medida em que as verbas bloqueadas poderiam ser destinadas à atividade estatal e às políticas públicas (custeio dos serviços públicos, pagamento de servidores etc). Assim é que se mostra imprescindível certo comedimento quando se tratar de bloqueio de valores em desfavor da Administração, não vislumbrando ser medida extremamente prejudicial à parte autora obter outros orçamentos como meio de ver seu próprio pleito efetivado”, consta em trecho da decisão publicada, na qual não é possível identificar o magistrado que assina, diante do segredo de justiça. Sem a resposta, sobreveio a ordem de bloqueio do valor das contas do Município. Inquérito civil – Na investigação iniciada pelo MPMS, o foco é entender porque cirurgias ortopédicas realizadas em hospitais privados com verba pública escalaram para valores tão elevados, com cobrança sobre o poder público e falta de oposição fundamentada aos valores apresentados nos orçamentos. Na papelada já incluída, a PGE (Procuradoria Geral do Estado) lança suspeitas sobre os valores, sugerindo “possível prática criminal”, sem especificar quais. O assunto chegou ao MP após estranhamento lançado pelo juiz da 3ª Vara de Fazenda Pública, Cláudio Muller Pareja. Um nome mencionado nos documentos que já constam no inquérito é da advogada Luciana Tosta Quintana Ribas. Ela conversou com a reportagem do Campo Grande News em mais de uma ocasião e disse que lutou por pacientes com problemas neurológicos que tinham histórico de longa espera na rede pública, rejeitando a existência de alguma irregularidade nas ações. Como obteve vitórias, acabou sendo procurada para mover várias ações na Justiça. A PGE negou haver inércia na contestação dos valores e apontou que atua “de maneira diligente na contestação dessas ações judiciais, buscando garantir a adequada prestação do serviço público de saúde sem comprometer a gestão responsável dos recursos estatais”. A assessoria jurídica do Governo sustenta que o local para essas cirurgias deve ser a rede pública. Já o Município já tinha questionado valores exorbitantes em suas defesas nos processos, tanto em ações relacionadas à ortopedia quanto de neurologia. A judicialização da saúde para a obtenção de procedimentos e medicamentos é um assunto que preocupa a Administração Pública, diante da elevação do número de casos. Conforme dados divulgados pelo TJMS, em 2023, foram ingressadas 6,5 mil ações; em 2024, esse número subiu para 7.659, e, neste ano, já são 810 novas ações até fevereiro.
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